ELE, SEGUNDO EU


Quando a gente escreve saímos um pouco de nós.
Ou será que somos nós ainda? 

O Homem do Zodíaco


Será que você o conhece? Já o visitou na sua humilde residência? Acaso sentou-se à mesa e tomou duas xícaras do café feito por ele, enquanto proseavam sobre os mais copiosos assuntos? Se não, senta-te aí e fita teus olhos nas informações que eu, sigilosamente, vou te transmitir.

Ele é tão lento para se zangar quanto igualmente lento para ter sua ira aplacada em situações que lhe deixem nervoso. Quando irado, devo lhe dizer logo de antemão, que tal ressentimento pode perdurar por um longo tempo, podendo, inclusive e infelizmente, eu posso afirmar, estender-se por toda uma vida. Creio que seja este um de seus instintos naturais, afinal, ele é humano que nem eu e você.

A calmaria é uma de suas principais características. Certa vez, houve um sucinto incêndio na vivenda em que habitava, e enquanto corriam gritando e desesperados os vizinhos atordoados pela fumaça que se espalhava pela vila, ele juntava, pacientemente seu álbum de fotografias como se o fogaréu tivesse cessado somente para a conclusão de sua ação.

Capaz de se apaixonar fortemente, apesar do temperamento, costuma entregar por completos sua alma e seu corpo a uma paixão. Sua intransigência e seu temperamento e sua idiossincrasia parecem perderem-se de seu corpo, igual a um crustáceo ao trocar de casca, quando tem por quem se dedicar. Além disso, a perseverança é uma das qualidades que mais me provam a admiração que por ele, orgulhosamente, tenho.

Tediosamente atento aos mais ínfimos detalhes, pode passar horas olhando uma formiga como um detetive a descobrir o segredo de seu destino desde um naco de folha que arrancara da plantinha conservada à beira da janela, até o formigueiro. Perto dele, sinto-me tão nu. Ele parece sempre alguém que ainda não conhece a natureza.

Observações à parte, vejo a modéstia em todas as suas decisões, sempre oportunas, mesmo aquelas tomadas subitamente àquelas tomadas pacientemente, como geralmente o faz.

Tão cuidadoso! Zela pelo que possui e luta pelo que almeja. Certamente, seria capaz de plantar uma semente de tamarindeiro e esperar incansavelmente o primeiro fruto a cair da árvore.

Não liga e me afigura nunca ter ligado para fortuna, precisando dela apenas para manter-se vivo, o que já lhe basta. Contenta-se com o carinho e o afeto se ofertados por pessoas que estime, pois tem pleno sentido de que a felicidade na vida é coisa muito simples. E admirar a beleza de tudo o que o cerca, já o deixa satisfeito por existir.

Infelizmente, na sociedade da qual faz parte – e ele tem afeição pelo trabalho que exerce, mas não vou lhes informar – muitas vezes é influenciado por muitos, porém, sua persistência e sua insistência fazem com que ele haja de acordo com seus ideais e seus princípios.

Até hoje, jamais ouvi relatos de sonho algum proferidos de sua boca. Vive sempre com os dois pés no chão, e gosta e é feliz assim.

Planeja a vida com tanta cautela e tem tanto medo de errar que acaba perdendo muito tempo com planos e cálculos e mais cálculos, como se tudo pudesse ser projetado, nunca agido por impulso.

Entre suas inúmeras virtudes, o egoísmo e a teimosia talvez sejam seus maiores defeitos, sendo capaz de controlar notadamente cada um de seus arroubos.

Sempre vestido de roupas em cores escuras, nem aparenta o gosto pelo colorido da natureza, muito admirado por ele na plumagem dos pássaros que posam em sua janela a ciscar o vaso no qual mantém a planta que floresce a amarelar com suas pétalas todo o ambiente e no colorido jardim da vizinha, onde brotam rosas de múltipla aquarela.

Descarta qualquer pessoa ou pensamento negativo, e sua positividade o ajuda a preservar os amigos de tal forma, que muitas vezes, me dá a impressão de são todos umbilicalmente ligados a ele.

E o que nele mais me fascina é a forma de como encara os fatos e as razões pelas quais eles acontecem diante da vida. Para ele, o dom de viver é uma dádiva a ser conjugada sempre no presente. Eu, seu amigo e admirador, sinto-me agraciado por conhecê-lo.

Ciomar Amil

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